domingo, 12 de fevereiro de 2012

A Honra de ser karateca


“Ensinar a dar socos e pontapés e uma tarefa fácil. Mas este não e o objectivo do Karate. Temos um grande compromisso com a sociedade”. Era o que afirmava constantemente o Mestre Sagara aos professores antigos,nos cursos e treinos que ministrava a esses professores.
 Era uma alerta quanto ao rumo que o Karate-Do estava a tomar.
Afirmava que o conceito que se criou em torno do Karate moderno não somente excluía um passado de tradições, mas desvirtuava o verdadeiro sentido da Arte.
Infelizmente, o factor competição tem sido a causa principal do desvio dos princípios essenciais da nossa Arte. Pensando-se apenas em criar campeões, as academias vem perdendo a sua aura sagrada, pois Dojo significa local de aprimoramento do ser humano na sua plenitude, não somente no aspecto físico, mas também no mental, no  psíquico e no espiritual.
Praticar o Karate-Do a partir dos princípios do Budo, código de honra dos guerreiros Samurais, leva-nos a trilhar o Caminho do crescimento e da evolução. Crescer e evoluir significa tornar-se mais sábio. E a verdadeira sabedoria nos revela entre tantas, a virtude da humildade. Por isso, o sábio assume a sua ignorância, pois esta ciente do malefício que o ego inflamado provoca, tornando as pessoas arrogantes e fechadas em si mesmas. Tornando-se sapos de poço que desconhecem oceano, como dizia Mestre Sagara.
E isto é o que acontece com as pessoas que colocam a competição como o único objectivo do Karate-Do. Isto atinge não somente os atletas, mas professores e dirigentes.
Exercitar uma aula não basta. E necessário, antes de tudo, honrar a Arte deixada pelos Mestres. Nesta perspectiva, praticar o Karate-Do não é simplesmente vestir o kimono e suar. Deve-se considerar o Dojo um campo de batalha; o kimono, uma armadura; e o nosso inimigo, que enfrentaremos num kumite interminável, o nosso ego cheio de medos e fraquezas que relutamos em aceitar. Ao treinar, encarar o treino como se fosse o derradeiro de nossa vida. Realizar cada movimento e cada respiração em Zanchin - estado de alerta - através da atenção plena, como se disto dependesse a nossa sobrevivência.
Através da atenção plena, podemos direccionar a nossa vida para o verdadeiro Caminho, pois a finalidade do Karate-Do é promover a harmonia em todos os aspectos de nossa vida. Na atenção plena da mente, somos capazes de observar e conter as nossas impulsividades e atitudes negativas originadas de nossos hábitos e automatismos que nos tornam inconscientes, tal como os praticantes que buscam a supremacia não somente nas competições, mas em outras actividades humanas na qual participam.
Num mundo marcado por tantas contradições, é uma honra pertencermos à classe dos Karatecas, verdadeiros guerreiros modernos. Pois praticar o Karate-Do na sua essência, coloca-nos em sintonia com a Sabedoria Ancestral e a Força Interior de todos os Mestres que dedicaram as suas vidas à Arte desejando forjar pessoas com personalidades saudáveis para a criação de um mundo mais pacifico e justo.
            E creio que foi com este pensamento que o O-Sensei Gingin Funakoshi escreveu:
“... Pense na vida de cada dia como um treino em Karate. Não limite o Karate apenas ao Dojo, nem o considere apenas um método de luta... o espírito nascido do esforço e ranger dos dentes de frio no treino durante o Inverno, ou nascido do suor do treino do verão, pode ser-lhe muito útil no seu trabalho. E o corpo que se forjou nos pontapés e nos socos da prática intensa não sucumbira as provocações de não estudar para um exame difícil ou de não levar a cabo uma tarefa enfadonha. Alguém cujo espírito e força mental, se fortaleceram através das lutas com uma atitude de nunca desanimar, não deve encontrar dificuldade em enfrentar nenhum desafio, por maior que seja”.



  A PARÁBOLA DO FAIXA PRETA.

Certa vez, um praticante de artes marciais estava ajoelhado diante do seu mestre, para realizar a cerimónia de receber a sua faixa preta que foi obtida com muito suor. Depois de muitos anos de treino incansável, o aluno finalmente havia chegado ao que comummente julga-se ser o auge de uma disciplina marcial.
“Antes que lhe dê a faixa preta, você precisa passar por um outro teste”, diz o Sensei.
“Estou pronto” responde o aluno, talvez esperando pelo último combate.
“Você tem que responder a uma pergunta essencial: Qual é o verdadeiro significado da faixa preta?”
“O fim da minha jornada”, responde o aluno. “Uma recompensa merecida pela minha dedicação, o reconhecimento do meu treino”.
O Sensei espera alguns minutos, demonstrado que ainda não está satisfeito com a resposta. Então, o Sensei diz: “Você ainda não esta pronto para receber a faixa preta. Volte daqui a um ano”.
 Passado mais um ano, o aluno ajoelha-se novamente em frente do Sensei.
“Qual é o verdadeiro significado da faixa preta?”. Pergunta o Sensei.
“É o símbolo da excelência, é o nível mais alto que se pode atingir na nossa arte”, responde o aluno.
O Sensei fica em silêncio, esperando por um complemento à resposta. Por fim, ele fala. “Você ainda não esta pronto para a faixa preta. Volte daqui um ano”.
Um ano depois, o aluno ajoelha-se novamente em frente do Sensei. E mais uma vez o Sensei pergunta: “Qual é o verdadeiro significado da faixa preta”.
“a faixa preta representa o começo, o início de uma jornada sem fim, de disciplina, trabalho e busca do aperfeiçoamento não somente técnico, mas também do carácter”, responde o aluno.
“Agora você está pronto para receber a faixa preta e iniciar o seu treino”. Diz o Mestre.

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